Tempos exigentes
Mais do que em qualquer outra época da história do nosso país, os Gestores de Ativos Humanos, têm alertado para o fato da verdadeira riqueza das nações não estar na dimensão, centralidade geográfica ou recursos geológicos que existem no seu subsolo, mas sim no conhecimento, cultura e capacidade de realização das suas pessoas. Contrariamente ao que muitos “tudólogos” propalam, os países com maiores índices de riqueza, desenvolvimento e felicidade não são os que possuem as chamadas riquezas naturais, mais sim os que tiveram a capacidade de criar uma sociedade justa, que valoriza, aproveita e desenvolve a energia e criatividade das pessoas. Os recursos geológicos esgotam-se ou tornam-se dispensáveis, As pessoas adaptam-se e criam novas formas de riqueza. É por isso que países como a Dinamarca e a Finlândia são países ricos e felizes e outros conhecidos pela sua extensão e riqueza mineral continuam atrasados e infelizes.
É, por isso, que um dos maiores riscos para o futuro do nosso país (que se poderá transformar num drama), provocado pelo período de “depressão” que temos vivido, é o fato de muitos jovens em quem o Estado investiu fortemente e que possuem um elevado potencial de contribuição, se verem compelidos a procurar oportunidades profissionais no estrangeiro.
Chamamos-lhe risco (futuro) e não drama (atual), porque o mundo em que estes jovens vão viver é muito diferente daquele em que muitos de nós vivemos. A globalização veio para ficar e seguramente terá um impacto crescente na vida das pessoas, das organizações, das cidades e dos países. As Organizações, por exemplo, há muito que perceberam que o mundo é global em todos os aspetos, nomeadamente na atração de talentos, razão pela qual há muitos anos que se “importam” engenheiros informáticos da India para os Estados Unidos, Médicos de Cuba para Portugal ou Engenheiros Civis de Portugal para o Brasil.
Contudo, o conceito de emigração que existia nos anos vinte do século passado para o Brasil, nos anos sessenta para França ou mesmo nos anos noventa para a Suíça está completamente ultrapassado. O que se passa (desejo eu) com estes jovens qualificados não cabe no conceito de emigração, mas sim no conceito de mobilidade. O jovem engenheiro do Porto que vai trabalhar para uma “software house” em Munique, mesmo que leve a sua família, sente que aquela “deslocalização” é temporária, antevendo que alguns anos depois poderá estar a trabalhar em Barcelona, Xangai ou . . . Lisboa.
O grande risco que as nossas cidades e que o nosso país correm, não é o de deixarem sair estas pessoas. Elas poderão ir e voltar mais fortes e mais preparadas. O drama existirá se não conseguirmos criar condições económicas e sociais (bem estar) concorrenciais com outras cidades e, em face disso, não os conseguirmos atrair de volta.
As empresas foram pioneiras em estratégias de atração de talentos, algumas das quais foram seguidas e adaptadas por algumas cidades. Percebendo que pessoas competentes e motivadas são o principal fator de sucesso, as melhores empresas investiram na criação duma marca de empregador (employer branding) atraente para quem querem contratar, estruturando formas de compensação justas e adaptadas aos diferentes segmentos de colaboradores e promovendo culturas de trabalho (estilo de liderança, flexibilidade de horários, equipas, ambiente, etc.) que lhe permitam não só atrair, mas também desenvolver e reter os melhores talentos.
Foi neste alinhamento que nos últimos anos surgiram as denominadas “cidades criativas”, (conceito de Richard Florida) as quais apostam deliberadamente na capacidade de atrair empresas e pessoas criativas e inovadoras, assente na criação dum conjunto de condições ambientais que passam por três T’s: Talento, Tolerância e Tecnologia. Estas cidades conseguem atrair uma população diversa e com um elevado nível de qualificação através do investimento em boas escolas, duma intensa dinâmica cultural, duma grande qualidade de vida e de excelentes infraestruturas tecnológicas. Esta “comunidade diversa” retribui com a sua energia e a sua capacidade de inovação, tornando nestas cidades ainda mais prósperas e atrativas.
Em geral, as cidades Portuguesas têm excelentes condições humanas e naturais para se tornarem em cidades atraentes para Portugueses e Estrangeiros. Para isso é fundamental definir estratégias e reforçar o investimento na criação de condições para que, de forma sustentada, respeitem e valorizem as pessoas, individual e coletivamente. Elas são a grande riqueza que Portugal tem.
Ativos Humanos
Se existe no léxico da gestão frase que qualquer CEO, Diretor ou Empresário profira pelo menos uma vez por ano.é “o ativo mais importante desta empresa são as nossas pessoas!”. Quanto mais não seja, no discurso do jantar de Natal, aí está o “Chefe” a proclama-la pública e solenemente.
Trata-se duma frase que considero paradoxal, porque, na grande maioria dos casos, é proferida com convicção e honestidade. De fato, o Gestor que a pronúncia reconhece que, mais do que os equipamentos, o financiamento ou as tecnologias, foi o empenho, energia e criatividade da equipa que, verdadeiramente, foi “trigger” do sucesso alcançado. É, simultaneamente, uma frase absolutamente verdadeira. Nos dias que correm até os mais empedernidos financeiros tiveram que se render à importância determinante que o fator humano tem nos resultados de qualquer projeto empresarial.
Contudo, apesar destas duas características, esta frase é na maioria dos casos uma enorme falácia, por duas razões. A primeira é que, apesar da solenidade e (em muitos casos) a convicção desta afirmação, a larga maioria dos seus proclamadores não passa das palavras aos atos. Como se dizia numa empresa em que trabalhei “They don’t walk the talk”.
De facto, são inúmeros os casos, em Portugal e no estrangeiro, em empresas nacionais e multinacionais e em empresas de sectores tradicionais ou de setores de ponta, em que, mesmo sem se aperceberem, os gestores decidem com grande facilidade enormes investimentos em novas instalações, equipamentos ou software, mas cortam, adiam ou discutem arduamente um pequeno aumento nos “custos” salariais, no orçamento para formação ou no prémio de produtividade. Se, como os seus gestores defenderam noutros fóruns, as pessoas são o fator critico de sucesso das suas organizações, então, algo de muito contraditório se passa nas prioridades destes gestores.
A segunda é que nem todas as pessoas que trabalham numa organização são um ativo. Alguns são apenas um passivo! Verdadeiramente “o ativo mais importante” são apenas os colaboradores competentes, motivados e focalizados.
De facto:
O que levará pequenos e grandes Empresários e Gestores, que até reconhecem por palavras a importância crítica das pessoas em qualquer negócio, a estar disponíveis para gastar, sem um momento de hesitação, milhares de euros em instalações e equipamentos e depois a discutir ao cêntimo qualquer verba a despender com Pessoas?
Estou convencido que a maioria dos gestores e empresários comunga, mesmo que subconscientemente, duma crença profunda que as instalações, equipamentos e softwares são um investimento (que dará um retorno) e que as pessoas são um custo obrigatório, do qual não retiram nenhum benefício. Nada mais errado! Um gestor que pare um minuto para meditar sobre a sua experiência passada, concluirá que, nos dias que correm, encontrar instalações, equipamentos e até o dinheiro para os pagar é fácil. Difícil é ter uma boa ideia e depois encontrar, atrair, motivar e reter as Pessoas certas para a porem em prática.
A gestão de pessoas deverá ser feita como um investimento, do qual se deverá esperar um retorno adequado. Só que nesta, como em várias outras matérias, investimento é dinheiro, porque pessoas não são “commodities”. As pessoas têm competências diferentes e dão contribuições diferentes. Não podemos esperar pagar a um Engenheiro experiente, com certificações exigentes e com um experiências comprovadas, o mesmo nível salarial que pagamos a um pessoa que não possua o mesmo tipo de formação, certificações e experiências.
Mas no que se refere a pessoas, investimento não é apenas (nem é principalmente) dinheiro. O principal investimento que se pode fazer nas pessoas, individual e coletivamente, é principalmente tempo e emoção. De fato, existindo justiça e equidade salarial, o que fará verdadeiramente a diferença na gestão das pessoas é o tempo e a emoção que os líderes dedicam às suas pessoas. Quanto menos se investe em tempo e emoção mais se terá de investir em dinheiro.
Defendo há muito que a principal função dum gestor é atingir resultados organizacionais através da coordenação e potenciação de esforços individuais, isto é, a tarefa essencial dum gestor é influenciar positivamente os desempenhos dos membros da sua equipa. No entanto, estudos efetuados ao longo de muitos anos e em diversos tipos de organizações, provam que apenas uma pequena parte do tempo dos gestores é utilizada em atividades de apoio e orientação das suas pessoas.
Convém, contudo, salientar que o que verdadeiramente tem impacto na motivação e consequente empenho dos colaboradores não é apenas o tempo dedicado, mas o tempo e a emoção que o líder coloca na relação com as suas pessoas. É esta diferença que permite distinguir a gestão de “Pessoas” da gestão de “Pessoal”.
Gestão de Pessoal é o tempo dedicado a tarefas como a definição de horários, controlo de ausências, marcação de férias, administração de prémios, marcação de cursos, entrevistas de recrutamento, etc. Gestão de Pessoas são tarefas simples mas que implicam ligação emocional, como sejam acolher o colaborador no primeiro dia, apoiá-lo numa dificuldade, perguntar e ouvir verdadeiramente a sua opinião, dar feedback sobre um tema, reconhecer um bom trabalho, celebrar uma vitória, etc.
Talentos
Em tempos como os que vivemos, as pessoas tornaram-se num fator ainda mais decisivo. Em ambientes crescentemente competitivos, com margens cada vez são mais apertadas e nos quais é cada vez é mais difícil motivar as pessoas, o sucesso exige doses acrescidas de energia e criatividade. Este ambiente (comum a quase todos os setores) torna-se ainda mais dramático quando essas organizações atravessam períodos de crise ou processos de mudança ou como fusões ou aquisições, diversificação dos negócios, internacionalização, “downsizing” ou “turnarounds”, entre outros.
Se alguma coisa se aprendeu nos últimos anos, é que num ambiente crescente e dramaticamente competitivo como aquele em que vivemos, apenas sobrevivem as organizações que possuam equipas competentes, motivadas, alinhadas com os valores e focalizadas nos objetivos e com capacidade de realização, isto é, equipas talentosas.
Mas o que é isto de talento? È uma pergunta pertinente e com uma resposta difícil. Talento é uma daquelas coisas que temos dificuldade em definir, mas que reconhecemos de imediato quando o encontramos.
Gosto mais de falar em talentos do que em talento. O talento tem sempre de ser avaliado em relação a um objetivo ou atividade em concreto. Temos pessoas muito talentosas para o desporto, mas que por muito que tentem não conseguem tocar uma musica num piano. Quando em muitas organizações se fala em talento, dá a ideia que nos referimos a meia dúzia de “iluminados” que possuem o dom divino do talento e todos os outros são deserdados dessa benesse. Ora isto não é verdade. Aquele grupo pode ser talentoso para um determinado fim, mas outras pessoas possuem talento para outros fins, igualmente relevantes. A expressão Gestão de talento é exclusiva. Uns são talentosos e os outros não. Gestão de talentos é inclusiva. Existem vários tipos de talento e todos são necessários para o sucesso do projeto.
Por outro lado, tal como se existir um jogador mais fraco numa equipa de voleibol, é para aí que os jogadores adversários enviam a bola, também se existir uma área com pior desempenho numa empresa, será aí que a concorrência irá atacar. Não chega ter apenas um ou vários talentos, Todos os membros do grupo têm de ser inequivocamente talentosos e têm de se tornar numa equipa talentosa.
Mas, em termos organizacionais, o que é isto dum Talento? Não chega ter uma ideia vaga e difusa e fazer uma comparação com o mundo do futebol.
Talento existe quando uma pessoa junta uma elevada competência (I can), com uma forte motivação (I want), somando-lhe uma grande capacidade de realização (I do) e sobre isso coloca uma genuína vontade e capacidade de ir cada vez mais longe (I Will).
Em matéria de talento, como em muitas outras não há milagres. Há investimento!
José Bancaleiro
Managing Partner
Stanton Chase Portugal – Executive Search Consultants